quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Por que fotografamos tanto



Seja a foto do passeio do final de semana, da selfie de frente ao espelho do banheiro, dos momentos de descontração, das fotos de desafios das redes sociais, ou até mesmo, daquele acidente presenciado na esquina, tudo é registro para nossos olhos, ou melhor, nossas lentes, sejam elas de celulares ou de câmeras diversas. E embora eternizemos todos esses recortes do nosso cotidiano, não paramos para nos perguntar por que o fazemos. Por que é tão importante fazer de nossas ações uma imagem fotográfica? Por que a necessidade de “instagrarmos” o momento vivido?

Primeiramente, a fotografia na sua origem, foi tida como arte menor, ou até mesmo, desconceituada de adjetivos artísticos por grande parte dos artistas da época. Isso se dava ao fato de que ela apenas reproduzia a realidade de maneira mecânica, sendo o fotógrafo apenas um observador de todo o processo, como citou Baudelaire. Mas o próprio Baudelaire desejou ter o retrato de sua mãe como confessou em carta dirigida a ela em 1865: “eu gostaria muito de ter teu retrato (...) existe um fotógrafo excelente no Havre.” Isso mostra que eternizar a pessoa, o momento por meio de fotos não é uma prática do agora. Mas a importância que hoje se dá para a fotografia só começou a ganhar vida recentemente graças aos trabalhos de Walter Benjamim, na Alemanha e Roland Barthes, na França. É importante dizer que nessa época as famílias davam uma importância muito grande para o momento do registro. Havia o dia de ir ao fotógrafo como nos conta Brassai em Proust e a Fotografia: “ir ao fotógrafo era um processo complicado e os preparativos, quase que tão complicados quanto o condicionamento de um paciente para uma operação cirúrgica. Trajes especiais, penteados sofisticados eram debatidos em família. Não contentes com se endomingar antes de posar solenemente para a posteridade, ornamentavam-se com verdadeiras fantasias, chapéus, etc.; nunca antes usados ou que jamais seriam depois (...)”. Momento quase que semelhante vivemos na época da câmera de filme analógico em que, pela impossibilidade de se ver a foto antes da revelação, tinha-se o maior cuidado em se posar corretamente diante da máquina.

Feita essa pequena explicação histórica do modo como se concebia o registro fotográfico voltemos a nossa reflexão. Vemos que a essência do instante contínuo fotográfico permanece quase a mesma: a captura de parte de uma realidade. No entanto, o objetivo que cada “tirador” de fotos tem é que será capaz de responder por que fotografamos tanto.

Não raro, vemos fotos de fotos de pessoas que registraram um incêndio, ou acidente sem que os registros lhes servissem muito. Apenas se fizeram do momento e, click. Talvez a autoafirmação de onde estou e o que estou fazendo. Já para fotógrafos profissionais, e até mesmo alguns amadores, a fotografia é expressão de sua cultura. É levar a outros olhos, o que os olhos por trás das lentes viram. Para estes, a exemplo de Barthes, uma foto pode ser objeto de três práticas: fazer, suportar, olhar. Mesmo estes não fotografam somente como expressão do seu trabalho. Muitas vezes, saem a clicar paisagens e cotidianos urbanos.  Igualam-se, em certos momentos, aqueles que tudo fotografam e usam essas imagens para confirmar a realidade e para realçar a experiência por meio de um consumismo estético, como nos diz Susan Sontag.  

Tirar fotos é um evento em si mesmo. É um ato dotado de subjetivismo. Tanto a fotografia amadora, ou profissional constitui um recorte do momento, uma interpretação de mundo. Parafraseando Mallarmé que disse que tudo no mundo existe para terminar num livro. Hoje, não temos dúvidas de que tudo existe para terminar numa foto. Resta-nos apenas saber por que todo ato vivido queremos transformá-lo em imagem-fotográfica.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

O colorido do Mascarado Fobó

Em Óbidos, a presença de um personagem se sobressai em meio aos muitos foliões que seguem os trios elétricos pelas ladeiras da cidade presépio no período do carnaval. Este personagem é o famigerado Mascarado Fobó.

Com a indumentária toda colorida, essa figura maior do carnaval dos obidenses dá brilho e vida cultural aquele que é considerado o maior carnaval de rua da região oeste do Pará. O Fobó é a manifestação das pessoas que ainda tentam preservar a cultura local vestindo-se de dominó, pulando alegremente ao compasso das marchinhas, ou das músicas dos blocos.

Quem vem a Óbidos, no período carnavalesco, vê esse misto de “palhaço alegórico” misturado à multidão nos sete blocos que compõem a quadra carnavalesca obidense. Mas sua presença é mais marcante no bloco Unidos do Morro, que é considerado o bloco oficial do Mascarado Fobó.

Brincando a frente do bloco, os mascarados vão levando alegria e desconfiança a quem assiste, pois a qualquer momento, o espectador pode ser surpreendido pelo amido de milho, item indispensável do mascarado.

E assim, o carnaval obidense se destaca graças à figura deste pitoresco personagem.












segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Espelhos virtuais



Em tempos em que é quase obrigatório estar conectado as redes sociais para manter-se “vivo”, bem que a mais famigerada indagação de frente ao espelho poderia ser outra: “espelho, espelho meu” existe alguém nesse “face” mais bonito do que eu? E nesse caso, porque não fazer a pergunta diretamente ao espelho como fez a rainha que se sentiu ameaçada pela beleza da branca de neve? Na verdade, hoje o espelho não mais corresponde somente a forma material do objeto pela qual nos acostumamos a ver nosso reflexo físico refletido, e sim pelos diversos meios que podem revelar quem de fato somos, ou queremos ser. Lembremo-nos de Narciso que se viu refletido nas águas limpas e tranquilas que serviram como espelho revelador da condição de belo que a ele foi revelada no momento em que viu a se mesmo, ou melhor, conheceu a se mesmo. Do campo da mitologia para a literatura, lembremo-nos do conto machadiano “O espelho: esboço de uma nova teoria da alma humana” em que o espelho reflete não somente a forma física, mas a essência da condição humana. Pensando desta forma, hoje, as redes sociais, e em especial aquelas em que se pode postar fotos, atuam como espelho revelador da alma humana. Sim caro leitor, a mesma revelação do alferes machadiano.

“Mudam-se os tempos... muda-se o ser”. Hoje, o sinônimo de existência vai além da condição física real. Ela se confunde com a vida virtual: “Penso. Faço uma selfie. Posto no face, logo existo”. Resume o significado de existência na era das redes sociais. A famosa selfie tirada, quase sempre de frente ao espelho do banheiro, é antes de tudo o nosso momento narcisista, embora não completo, pois, no mundo da hiperexposição não basta vermos nosso rosto pelo espelho da fotografia do celular, é preciso que compartilhemos para que o olhar do outro lance sobre nós o julgo da subjetividade expressa em curtidas e comentários.

Diferentemente de Narciso, não mais conseguimos contemplarmo-nos sozinhos. É quase que inconcebível guardar somente para si aquele autorretrato. Queremos torná-lo público. Queremos despertar no outro com fotos de nós mesmos a mesma sensação que Narciso sentiu por si mesmo. Tanto que, muitos aplicam filtros e mais filtros em suas fotos que chegam parecerem bonecos de cera opacos e sem vida. Como se o auto-fotogafado, descontente da leitura que a câmera faz dele, introduz na imagem um filtro no intuito de agradar o expectador, e esse observador faz nova leitura, pois não vê nem a pessoa real, nem a representação da captura da câmara escura, e sim uma representação da alma daquele que se auto-fotografou: como eu quero ser visto.  

Por fim, somos sujeitos que necessitamos dessa revelação a qual o espelho é capaz de nos dar. Seja o espelho da selfie, das redes sociais, da própria fotografia quando captada e exposta ao outro, seja pela nossa condição de alferes machadiano, enfim, parece que depositamos no autorretrato a mesma essência de quando nos embelezávamos e ficávamos muito contentes quando o elogio vinha. Nosso espelho é outro. Nosso questionamento é subjetivo e vai muito além de sermos ameaçados pela beleza física do outro. Somos os novos narcisos a contemplarmo-nos com a nossa própria imagem refletida na palma da mão.